Dois anos passados de uma quase precisão espacio-temporal. Retorno ao Porto de câmara na mão. Não para um concerto, como em Dezembro último. Desta vez não foi o comboio que me trouxe, aventurei-me de carro levando a pequena comigo. Com os amigos à espera, a manhã passou a voar. Vi um outro Porto. O do Douro e o do sonho. O do vaguear e o do descobrir. Roupas e intimidades descobertas estendidas em cordas, esvoaçantes. As vozes e sons pronunciados, típicos.
Encanto. Sorrio.
Corrida a manhã, entre ruelas e escadarias, odores e gataria, almoço precisa-se. Sentados os quatro na esplanada em conversa divertida, o repasto aguardávamos.
E de repente um braço estendido na recolha da louça anterior, captou a minha atenção. Braço de rapaz jovem, de pêlos rapados. Tatuado. Educado no trato. Nada mais fixava que aquelas duas linhas de letras preenchidas e assaz sentido de vida. Filosófica. Profunda. Dorida.
Envergonhada dei por mim, com delicado pudor questionar: “Esta frase é tua?”.
E o Ruben (é este o seu nome) responde sorridente: “Quase! Adaptei-a apenas a mim!”.
Pedi, também eu a sorrir, se podia fotografar. Anuiu.
- E partilhar, posso?
- Claro que sim.
Curiosas no olhar e quase sem perguntar, o Ruben explicou o significado.
Fora abandonado pela mãe ainda bebé. Recolhido foi por uma família de adopção.
Cresceu num meio de trabalho e educação. Sempre agradecido e conhecedor da sua história de vida. Lutou por ele e pela sua família. A única. A que o ama. Estuda e trabalha. Ambiciona. Sabe que é possível. Basta querer. Os seus pais do coração quiseram.
Como forma de nunca esquecer esse amor e esse sacrifício, decidiu gravar em dor essa frase que o acompanhará:
“Para quem sabe olhar para cima
Nenhuma rua é sem saída”
(texto de 12.12.2018)