Saíra cedo naquela manhã. O voo esperava-a. Queria reviver no silêncio das suas ruas os momentos que meses antes tivera com Omar.
Naquela tarde longínqua na cidade de Roma, deixara o trabalho no escritório para caminhar um pouco. Estava saturada. Irritada. As pessoas professam uma única religião, a do próprio bem-estar. Lançam as suas preces e oram aos seus deuses sem qualquer sentimento ou fé. Ocas. Vazias. Desilusão.
Deu por si numa ruela sem saída, que desembocava num largo. Solitária, aquela árvore despertou-lhe a atenção. Cada ramo isolado desenhando contornos despidos. Caminhou até ela…
E do outro lado, sentado numa das raízes salientes, um homem. Parecia alto, moreno. Sério o rosto, triste o olhar. Pensou: O sorrir não mora ali.
- Buon pomeriggio! - proferiu, não esperando resposta.
- Boa tarde! - foi a resposta.
Surpreendeu-se com o inesperado cumprimento em português. Sorriu. E durante longos meses continuou a sorrir e a brilhar. Andava feliz. O amor fizera milagres.
A noite do telefonema fez desabar esse pequeno mundo que estava a construir.
Omar tivera que ir ao país natal. Assuntos de família. No regresso da aldeia e enquanto esperava na cidade por um táxi que o levasse ao aeroporto, não teve sequer tempo…
Um bombista-suicida acabara com os seus sonhos.
(…)
Hoje sabe que, quando estiver novamente naquele largo, abrirá os braços e num sussurro confidente, estas palavras dirá:
“Armo à minha volta um escudo e resguardo-me com uma frase que a memória me traz: «Morta por dentro, mas de pé, de pé como as árvores.»”
(texto de 05.12.2018)
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