Contaram-me que há um reino onde mora um encantador de sonhos que se esconde entre os ramos das árvores e que quanto mais o procurares, mais ele foge.
Contaram-me que nesse reino, o encantador muda constantemente de humor: já o sentiram furioso, benévolo, irritado, meigo, destruidor, aterrador, envolvente, triste, desconfiado, silencioso... até melodioso.
Contaram-me que o encantador gosta de abraços. Desconfio. Se ele gosta de abraços, qual a razão para fugir? Estranho.
Saí para um passeio nessa tarde de chuva. Conduzindo sem rumo certo, dei por mim numa estrada de terra batida, ondulada pela passagem constante de máquinas agrícolas; os campos a serem limpos para o repouso do Inverno. Estão para breve esses dias frios. Andei mais alguns metros com cautela. Parei espantada. O céu estava cinzento e tão carregado que a tormenta adivinhava-se. As nuvens corriam velozes, desenfreadas nessa fuga. De repente, um raio de sol escapa e o céu de chumbo explode em cor. Um arco-íris. Saio do carro. A porta escancara-se com violência, tal é a força do vento. Assusto-me ligeiramente. Mas quero admirar o belo momento da natureza e, apertando melhor o casaco, enfrento a sua fúria. O rosto é fustigado quase que com irritação. Os olhos lacrimejam, desprotegidos. Mas consigo assistir a esse fenómeno natural que dura um instante. Sorrio, feliz.
Ao voltar para o carro, percepciono uma evidente desaceleração do vento e noto ao Sul a beleza das nuvens quase feitas de sonhos de algodão. Mais um momento de respiração suspensa. Das árvores antes fustigadas com violência, apenas resta um bailado melodioso de ramos quase despidos. Sinto que há uma curiosa envolvência neste momento, uma serenidade que abraça esta comunhão com a natureza. Como num sonho, fecho os olhos e abro os braços. Sem tempo. Escuto. Murmúrios. Melodias. Sorrio. Sorrio e sinto. Afagos.
Volto para o carro em silêncio, pois sei que há um reino onde mora um encantador de sonhos. Hoje encontrei-o. Deixou-se ver.