Sopra a brisa cortante e elas, habituadas ao fustigar das intempéries, vão regulando a força que precisam, enraizadas, são altas e experientes, há muito que habitam este caminho, encostadas a esse muro de adobe, que esboroa e desmorona, tão lenta quanto compassadamente, sempre; da casa pouco mais resta que as paredes.
Por vezes a conversa recai sobre os antigos donos e no pouco tempo que viveram naquela casa. Um dia chegaram em burburinho trazendo um enorme carro carregado de malas coloridas. Mais tarde, nesse dia, chegaram as mobílias, novinhas. Também eles novinhos, de idade e na experiência de vida.
Sorridentes e enamorados todos os dias passeavam pelos campos e caminhos arborizados. Ao final do dia, sentados na varanda, às vezes com uma música suave de fundo, ela lia poemas em voz alta, enquanto ele fumava e vagueava o olhar no horizonte distante.
Mas um dia a música foi parando e as leituras cessaram. As vozes eram outras, exaltadas. "Tu queres, mas eu não quero! - dizia ele, irritado - Este assunto não era para ser tocado. Nesta casa não haverá crianças! Assunto encerrado!".
Na varanda, juntos, nunca mais foram vistos.
Um dia pela manhã, sob uma chuva torrencial, chega um carro preto devagar. Parou sem buzinar e a bela dama abriu a porta e, de cabeça erguida, tendo na mão apenas uma pequena mala de viagem, entra no carro e nele parte.
Dias mais tarde, ainda com menos burburinho e quase em silêncio, todos os bens da casa que estavam encaixotados foram arrumados e carregados no camião que chegara. Sem delongas, também ele sai de casa e desaparece, veloz, no meio do pó que levanta, no seu carro de luxo.
E desde então o esquecimento caíra na casa, ouvindo-se por vezes murmúrios que lembravam a discussão que acabara com a tranquilidade que ali morava.
Neste diálogo de vidas estavam elas entretidas quando são interrompidas pela mais pequena, "olhem ali, está um carro a chegar, teremos novidades?".
No que a sua altura consegue alcançar, a mais esguia espreita e esboçando um sorriso imaginário, diz:
- Novidades dessas que pensas, não, mas é sempre uma boa-nova e um prazer ter por cá a fotógrafa que venera este nosso recanto! Como será que vem hoje? Feliz, calada, sorridente, triste, a cantarolar, ou simplesmente aparece pelo prazer da paz que aqui encontra? Vejamos como caminha e logo descortinaremos, mas com frio está, não será fácil ver-lhe o rosto, tem um gorro a escondê-lo.
E por ali ficam, quietas, à espera e a observar com curiosidade quem para elas se tornou presença assídua, ainda que por breves períodos, nesse lugar a que ela chama, o silêncio dos pássaros.
(texto de 21.01.2019)
Sem comentários:
Enviar um comentário